sexta-feira, 31 de outubro de 2008

2.

Sem risco. Foi assim que nosso Assistente de Direção definiu aquela apresentação no domingo. Tudo, segundo ele, havia sido feito “direitinho”, mas... Acompanhado disso veio a informação da baixa venda dos programas ao final da peça. Aquelas duas informações recaíram sobre mim como uma bigorna. O modo como as coisas foram colocadas parecia que nosso trabalho estava tendo como termômetro a venda dos cartazes. Absurdo!

Conversa vai, conversa vem, todos discordávamos em nossas percepções sobre o que tínhamos acabado de vivenciar juntos. Juntos? Eu já duvidava. Particularmente eu tinha feito outro espetáculo: vibrante, atento, preciso, cuidadoso, investigativo. Assim eu acreditava. Mas fui com a pulga atrás da orelha pra casa.

Já de há muito eu venho me perguntando sobre como é possível que tenhamos percepções tão diferentes quando não completamente opostas em relação a um mesmo dia de trabalho. Quais são os pesos e as medidas utilizados para medir as coisas?

Isso me faz lembrar uma coisa linda que ouvi outro dia da boca de uma “atrizona-aí” sobre seu trabalho de pesquisa. Ela dizia que numa linguagem, cada um (deve) se torna(r) responsável em zelar por aquela poésis, cuidar dos segredos que são “revelados”.

Mas as cortantes observações do nosso Assistente foram em lugares mais profundos ainda aqui dentro. Porque somada a sua fala vinha o argumento de que alguém do público achara coisas semelhantes. Fui enganado por mim mesmo? Saí do teatro já com certa dúvida sobre a realidade do que aquele espetáculo havia impresso em mim. E com um fio de certeza, embora bem frágil, de que é sobre mim que deve estar a consciência absoluta capaz de dizer antes que qualquer um me diga sobre como meu trabalho está se dando. Não pode estar sobre o outro a responsabilidade de dizer a mim como as coisas estão se dando. Eu tenho que saber. Como isso é possível? Porque isso não tem a ver com estar fechado para ouvir o outro. Não tema ver. Mas sim em estar atento para ouvir a mim mesmo. Tem a ver com encontrar um lugar aqui dentro em mim onde eu simplesmente saiba mais sobre minha criação.
escrito quinta, 23 de outubro de 2008, madrugada sobre apresentação feita no duas semanas antes.
Por Kenan Bernardes

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